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ENTREVISTA DE ANDRÉ RICARDO AGUIAR
ENTREVISTA DE ANDRÉ RICARDO AGUIAR
por Belvedere




Belvedere - André, conte-nos sobre o início de sua trajetória literária. Fale-nos de influências, dificuldades, etc...

André Ricardo Aguiar - Do jeito que as coisas andam, acho que estamos sempre numa espécie de início. Mas falando sério... os incentivos do colégio deram o alicerce, digamos, para vencer a timidez inicial para tirar os escritos da gaveta. Tive uma professora que me deu um bom empurrão – pelo menos na estima... risos. Escolheu um poema meu para análise na sala de aula. Mas o pontapé, digamos, primordial foi a universidade, os primeiros contatos que tive com professores e poetas e o início de uma amizade com o Mariano, já autor na época. Minhas dificuldades, para ser sincero, foram mais de "técnica", estava ainda tateando a maneira de lidar com a escritura, com a arte. As dificuldades de publicar foram sendo vencidas aos poucos. Posso dizer que outro grande incentivo partiu do editor (na época) e poeta Sérgio de Castro Pinto. No Correio das Artes, o suplemento paraibano, comecei a me soltar, sentir o termômetro. Minhas influências foram a estante do meu pai, os poetas que me caíram nas mãos, Drummond, Pessoa e os poetas que passei a conviver por aqui.

B - Sabemos das inúmeras dificuldades que um escritor desconhecido do grande público enfrenta para publicar suas obras. Fale-nos um pouco sobre essa questão.

ARA - Hoje em dia está questão é relativa. Temos escritores desconhecidos e temos escritores iniciantes. Ou a imbricação dos dois tipos. Publicar em si é bem mais fácil do que há vinte anos, eu acho. Os meios apropriados ficaram domesticados e editoras pululam por aí. A dificuldade não está no "quem", mas no "que" publicar. Ainda creio que as maiores dificuldades passam por uma consciência crítica - essa qualidade rara que, quem não tem, aí sim, terá muitas dificuldades. Experimentar concursos, aceitar críticas, recusas. E publicar em jornais, suplementos. O "grande público" para muitos é uma entidade abstrata que nem sequer funciona como padrão de qualidade.

B - Bancaria suas publicações sabendo que correria riscos de "encalhes" como geralmente ocorre em tal situação?

ARA - Bancaria sim. Até porque não existe o encalhe puro. Pelo lado do marketing diriam que encalhe é má divulgação. Por outro lado, mais romântico, faltou entrega. Nos dois sentidos... risos. A melhor proposta é proporcional ao meio que se destina. Uma tiragem adequada, prevendo remessas para resenhas, críticos, amigos, um tanto para lançamentos, outro para livrarias, etc – pode ser a melhor solução para evitar o encalhe.

B - Acredita que os escritores possam modificar o panorama cultural de sua cidade, unindo-se e criando eventos culturais ou mesmo bibliotecas? Pensando nos preços dos livros que são altos não seria um motivo para a falta de leitura da maior parte da população?

ARA - Claro que podem. E temos prova disso se pegarmos inúmeros exemplos. Infelizmente, disponho de poucos a não ser da minha aldeia. Mas uma mirada apontará outros focos, com certeza. Aqui em João Pessoa ainda precisamos de maior incentivo por parte do governo e também uma maior coesão dos artistas, que são bons, embora ilhados. Há muita desinformação no meio e muitas práticas pseudoculturais. Algumas vezes a cultura se veste de mero turismo cultural, sem aprofundamento. Não acredito, no que concerne à questão da leitura, que apenas os preços altos sejam os vilões. É cultural mesmo essa falta de prática ou apego ao livro. Ninguém é obrigado a prejudicar o bolso para ter acesso a bons livros. Bibliotecas e sebos, também bancas, estão aí provando a possibilidade de boas obras por preços acessíveis. É claro que seria mais justo que as editoras facilitassem, possibilitando baixa de preço através de uma produção mais econômica de recursos.

B - Quando um escritor diz: Dos mais reveladores é o e-mail de Carlos Trigueiro que, comentando a crônica da semana passada, lá pelas tantas, diz: "Pasme. Nos últimos quatros anos, acertei na quina duas vezes, mas não consegui publicar três originais (dois romances e uma coletânea de contos). E, do jeito que as coisas vão, qualquer dia acerto na mega-sena! (Do artigo de Affonso Romano publicado hoje no jornal O Globo) como poderemos ter esperança de ver nossos livros publicados a não ser bancando com nossos recursos e correndo o risco de encalhe?

ARA - Exatamente assim. Tendo esperança. Um dia ou se publica o livro ou morremos. A esperança não é a última que morre. Somos nós.

B - Quais seus projetos imediatos?

ARA - Além de um livro de poemas, espécie de apanhado de 10 anos de atividade poética, estou aos poucos preparando um livro de contos, para publicar a perder de vista quando chegar a ocasião. E estou em fase de pré-produção de mais um livro infantil, a convite de uma editora. Afora isso, os projetos mais imediatos: a continuidade da atividade de colunista, as atividades de editar uma revista e integrar, junto com o Mariano, projeto de audição e discussão de contos.

B – Dos novos escritores poderia apontar um que tenha impressionado vc pela qualidade ?

ARA - Nelson de Oliveira, Amílcar Bettega Barbosa, Micheliny Verunschk, poeta de Arcoverde (PE), entre outros.

B - Quanto aos best sellers? O que entra na história?

ARA - Por mais que a exigência seletiva dê o ar da graça, quem não se permite ler um ou outro best seller ou está muito policiado ou é questão de princípio. O best seller é uma ótima questão sobre a comunicabilidade literária. Claro que também é relativa a classificação de best seller tanto quanto de cult para um livro. Um best seller pode funcionar como anzol para leituras mais aprofundadas. É uma leitura de imediatismo, ela dá o que o leitor quer, um leitor mais desleixado com suas opiniões, um leitor que aceita o código. Neste caso, um leitor feliz para o seu feijão com arroz. E há livros bem escritos quem caem no gosto do público, com sucessivas edições. O Perfume, O nome da Rosa, esses livros têm algo de best sellers, não? Não condeno os best sellers. Cumprem lá a sua função.

B - Já leu Patrícia Melo? Valsa Negra é excelente!

ARA - Não li Patrícia Melo. Apenas vi algo adaptado para o cinema.

B - Rapidinho!!!! Adélia ou Cecília?

ARA - Cecília pelo conjunto. Adélia, alguma.

B - Drummond ou Bandeira?

ARA - Ou os dois ou nada feito!

B - Neruda ou Lorca?

ARA - Lorca.

B - Florbela Espanca seria uma musa pra você?

ARA - Emily Dickinson seria mais.
  
      

  

belvedere
Enviado por belvedere em 15/09/2005


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